TUDO AZUL
Em "Tudo Azul", apresento uma série de desenhos criada a partir de fotografias de equipamentos de purificação do ar de várias cidades do mundo.
Esses estranhos elementos na paisagem se destacam por sua altura significativamente maior que a largura, com acentuada verticalidade, o que as inclui na tipologia de torre. Historicamente, as torres foram erguidas com diversos propósitos estratégicos. No entanto, nas cidades contemporâneas, a elas está sendo atribuída uma nova e crucial função: a manutenção da vida, através da purificação do ar.
As torres de purificação de ar podem estar localizadas em áreas com variadas funções do espaço urbano, tais como pontos badalação, cultura e lazer, regiões de tráfego intenso, locais de alta densidade populacional ou em zonas industriais contaminadas. Curiosamente, algumas permanecem invisíveis na paisagem. Enquanto outras, se tornam cenário para personagens aflitos em busca de uma selfie. Estes, provavelmente desconhecedores da verdadeira razão da presença dessas inusitadas construções.
Algumas apresentam-se num padrão estético ingênuo, o que nos remete às criações de inventores amadores e anônimos. Entretanto, também é possível identificar as assinadas por destacados profissionais de arquitetura e design.
Montadas com a utilização de diferentes recursos tecnológicos, as torres são implantadas como respostas de poderes locais às urgências anunciadas pela percepção sensorial dos habitantes. E também pela constatação de violações de padrões da qualidade do ar. Entretanto, apesar dos esforços, as avaliações do desempenho das torres demonstram serem estas ineficazes na função para a qual foram destinadas.
Inspirada na técnica dos cartões postais desenhados, populares até o início do século passado, "Tudo Azul" exibe paisagens reais. Nela, retratei esses novos equipamentos urbanos a partir de imagens obtidas em diversas bases de dados online.
O título da série "Tudo Azul" é uma expressão que remete a algo dentro do padrão, aceitável e em perfeita fluidez. As torres e demais elementos da paisagem foram representadas pelos tons do vermelho. Ao contrário do azul, o vermelho é comumente associado a impactos violentos, perdas, dívidas, valores negativos, ao passivo contábil ou situações de alerta máximo. Sinaliza algo que exige atenção, cuidado ou correção.
Usei a incongruência estabelecida entre o título e as imagens para realçar a contradição intrínseca à criação dessas novas "máquinas": elas surgem para resolver problemas vitais gerados pelos excessos do estilo de vida contemporâneo, destacando-se aí o uso de máquinas.
Penso então no contexto do tarot onde a imagem da torre representa o perigo iminente, a crise e a destruição. Mas também aponta a para a abertura de um novo caminho de construção e renovação. Ao mesmo tempo, penso na velocidade em que esses elementos com formas estranhas se integram à paisagem das cidades do século XXI. E, ainda, que estes não são capazes de reparar o passivo ambiental provocado pela atividade humana. Não nos “tiram do vermelho".
Talvez tudo isso sinalize uma oportunidade para reformularmos nossa relação com o mundo.
Como podes comprar e vender o céu ?